Melodia do tempo.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Aqui estou, sentado nessa cadeira de palha velha ouvindo um sabiá cantar uma melodia triste e solitária. Logo me pego viajando nos meus 7 anos, corria, pulava e cantava mais que qualquer passarinho já visto. Minha mãe, Dona Francisca como era conhecida passava horas em um asilo cuidando dos mais velhos que ela. Seu sonho era que eu fosse doutor. Posso ouvir a sua voz amorosa ao dizer que teria o poder da cura. Mas eu moleque vivendo o grande calor da copa queria mesmo  era ser jogador de futebol. Nós eramos pobres mas sempre frequentei boas escolas e me sentia na obrigação de tirar boas notas. Eram quatro horas naquela escola de mauricinhos, os pais vinham busca-los de carro importado todos engomadinhos dentro dos seus ternos e sapatos brilhantes. Meu pai era de longe um dos mais bem vestidos, ele me buscou na escola uma só vez, com um macacão velho e andando de forma estranha entre os outros.

Confesso que nunca vi muito amor entre meus pais, aliás ouvia muito mais gritos e até choros da minha mãe do que qualquer palavra carinhosa. Hoje faz 34 anos que amanheci sem meu pai em casa. Minha mãe apenas me disse que ele havia ido morar na casa dos meus avós já falecidos em Pernambuco.
Os dias foram se passando e meu pai saindo cada vez mais do meu quadro familiar. O que não imaginava era que veria ele antes do esperado. Não, de forma alguma deixaria a minha mãe, mas como disse sempre fui louco por futebol e essa loucura toda levou a minha mãe de mim. Era 28 de dezembro, em pleno verão, fui com a minha mãe olharmos as decorações na praça principal da cidade,  enquanto seus olhos brilhavam por uma árvore comum de natal os meus brilhavam mesmo era para a bola autografada em uma loja do outro lado da rual.
Não precisei de muitos esforço para puxar a minha mãe que parecia estar vidrada em todas aquelas luzes. Quando menos esperado ela se dá conta que estamos no meio da rua e que estou à arrastando para ver uma bola. Foi questão de segundos e a terceira guerra mundial começou ali mesmo no meio da rua. Não lembro de ver a minha mãe tão furiosa como naquele dia. Em meio a gritos eu disse que que a odiava. Não creio que fiz isso ainda hoje. Pensei que iria apanhar, mas ela só ficou ali parada sem mover um músculo se quer. Conclui a travessia e ela permanecia lá em seu ''estado de choque''. Quem dera eu ter apanhado doeria bem menos,  pois um carro levou minha mãe como se ela fosse um papel, um papel já amassado por dentro. Posse ver o rosto dela em meus sonhos ainda, me culpo tanto nas caladas da noite.
 Demorou para entender que a minha mãe havia falecido mas não tive demora alguma para que eu me sentisse culpado. Como todos do bairro me conheciam  consegui alguns trocados para ir à Pernambuco. A vida aqui é estranha eu e meu pai pouco conversávamos, nas horas das refeições era um silêncio total, não ia mais para escola. Saía de casa só para ajudá-lo em seu trabalho. Meu pai era pedreiro diga-se de passagem  o melhor da região.

Mesmo morando na mesma casa passava dias sem vê-lo, quem cuidava de mim era a senhora Maria do Carmo que por sinal tem um coração tão grande quanto o de minha mãe. Ela sempre me disse que meu pai tinha problemas sérios mas eu era novo demais para entender. Nesse termo eu concordo com ela, eu era novo mas não era tão ingenuo para não perceber os ataques de raiva sem motivo e o cheiro forte de bebida que ele tinha.
Vim dormir diversas vezes na casa de Maria do Carmo ela tapava meus olhos com força para não ver todo estrago que meu pai fazia. Uma vez aos prantos para me tirar de casa meu pai jogou um vaso em direção ao seu corpo, foram 7 pontos no seu braço já enrrugado.
Deixei meu pai sozinho, trouxe meus brinquedos para casa da minha agora segunda mãe. Poucas vezes vi meu pai abrir às janelas para se quer entrar um raio de sol. Sentia-o ainda mais longe do que na separação com minha mãe. Hoje a casa está lá, vazia, com a pintura gasta e as flores sofridas com o tempo.
A última vez que o vi, foi no hospital. Primeiro me parecia apenas mais um de meus nobres pacientes atpe ver a cor de seus olhos, a mesma cor dos meus. Era meu pai, precisava de uma transfusão de fígado o quanto antes. Lamento por ter me negado a ajudá-lo mas lamento ainda mais por não ter salvado.

Ainda moro com a dona Maria, hoje minha sogra e avó de meus dois filhos.
Sabiá já terminou a canção, a minha humilde e bela canção.

Foi só o tempo.

segunda-feira, 18 de março de 2013

Sabe porque Romeu e Julieta são ícones do amor, são falados e lembrados, atravessaram os séculos incólumes no tempo, se instalando no mundo de hoje como casal modelo de amor eterno?



Porque morreram e não tiveram tempo de passar pelas adversidades que os relacionamentos estão sujeitos pela vida afora.
Provavelmente Romeu estaria hoje com a  Manoela e a Julieta com o Ricardão. Romeu nunca traiu a Julieta numa balada com uma loura linda motivado pelo impulso do álcool. Julieta nunca ficou 5 horas seguidas esperando o Romeu... Ligando incessantemente para o celular dele que estava desligado.
Romeu não disse para Julieta que a amava, que ela era especial e depois sumiu por semanas.
Julieta não teve a oportunidade de mostrar pra ele o quanto fica insuportável de TPM.
Romeu não saía sexta-feira a noite para jogar futebol e só voltada ás 6 horas da manhã bêbado.

Julieta não teve filhos, engordou nem ficou histérica com muita coisa pra fazer. Romeu não disse para Julieta que precisava de um tempo, querendo na verdade curtir a vida e que ainda era muito novo para se envolver definitivamente com alguém. Julieta não tinha um ex-namorado  em que ela sempre pensava ficando por horas distante, deixando Romeu com a pulga atrás da orelha.
Romeu nunca deixou de mandar flores no dia dos namorados alegando estar sem dinheiro. Julieta nunca tomou um porre fenomenal e num momento de descontrole bateu na cara do Romeu no meio de um bar lotado.

Julieta nunca teve um crise de ciúme achando que Romeu estava dando mole para uma amiga dela. Romeu não tinha uma ex-mulher infernizando a vida da Julieta.
Julieta nunca disse que estava com dor de cabeça, virou para o lado e dormiu. Romeu nunca chegou para buscar a Julieta com uma camisa xadrez horrível.
Por essas e outras coisas que eles morreram se amando.

Está escrito.

sábado, 9 de março de 2013


Legítima chuva de verão e eu aqui pensando em nós dois em baixo das cobertas, em uma longa competição de cócegas.
Logo você reclamaria que estaria te arranhado com as minhas unhas, eu diria que você começou. Riríamos sem parar. Poderia passar horas decifrando a cor dos seus olhos, e te contando as histórias mais mirabolantes que me vem à cabeça.
Seria nós, fugindo de toda essa loucura e de todas as consequências por escolher apenas um ao outro. Você não faz a menor ideia do quanto te quero, mas não me importo em escancarar isso ao mundo. Afinal você me chama de ''minha linda'' já é suficiente para acreditar no amor.
Acha-me louca não é?
Louca mesmo, louca por esse sorriso, pelo teu cheiro e por esses teus longos braços que me envolveria sem problema algum.
Não percebe o poder que tem sobre mim, até a astrologia está ao nosso lado. Venha aqui agora e me faça rir de todos os meus problemas, você sabe fazer isso tão bem.
Sinto ciúme de cada gota que pode estar te tocando agora, nunca me senti tão submissa a alguém...

Conseguiu me prender direitinho em sua armadilha, mas me deixa te prender também.
Está na hora de você aparecer aqui e me levar pra longe, um lugar aonde vamos ver filmes, comer brigadeiro no meio dia e pular em cima da cama.
Um lugar para nos prendermos ainda mais um ao outro, onde até as estrelas marcam que teu lugar é comigo.




Monólogo sem fala.


Quarta-feira, duas horas da manhã, meia xícara de chocolate quente (agora frio), coração angustiado. Deixei rolar pelo fone de ouvido uma lista antiga de músicas enquanto insistentemente eu me forçava a sentir sono. Nada. Preciso parar de beber tanto café. 
Desisti de tentar dormir, observei meu quarto, preciso colocar tanto coisa em ordem. Fechei os olhos. Foi então que senti meu peito ser esmagado por uma música, torturante, nossa. Cerrei os lábios na falha tentativa de não chorar quando o refrão começou ''Então, me diz alguma coisa, bate aqui de madrugada, pra lembrar daquele tempo''. Durante os minutos seguintes eu desejei com toda a minha força por uma ligação sua, uma mensagem um sinal de fumaça ou qualquer coisa que pudesse nos reaproximar de novo, por algo que pudesse trazer de volta aquela nossa velha história sem pé nem cabeça que eu tanto gostava de contar e recontar ao mundo como se fosse um filme repetitivo da sessão da tarde, desses que a gente não cansa nunca de assistir.

Enquanto Armandinho embalava a minha luta para não derramar nenhuma lágrima eu quis voltar no só pra sentir seu hálito de tridente intense, seu cheiro forte de homem, seu pegada de cafajeste. Ansiei ouvir mais uma vez seu papo de conquistador barato, sua boa lábia sussurrada em meu ouvido, suas frases de impacto decoradas para ganhar essa disputa do amor. Você me ganhou.
Senti falta da esperança de um dia ter você pra mim, de ver o sonho virar realidade, de viver aquele script que eu montei pra nós. Enquanto a música ia chegando ao fim desejei que essa garota que agora ocupa o lugar que por direito devia ser meu não existisse, como se fosse ela o problema de nós dois nunca termos dado certo.
Tola. A questão não é ela, somos nós. Quando o quebra cabeça tá errado as peças não encaixam. Simples. 
Ouvi a música acabar sendo tomada por uma dor exaustiva. Sem mensagens, sem ligações ou sinais de fumaça. Lavei o rosto, sequei a alma e para não esquecer deixei anotado ao lado da xícara suja: ''Preciso dar um jeito no meu quarto, preciso dar um jeito na minha vida. Tá na hora de apostar em um jogo que dê certo''. A(dor)meci.




Autora: Gabriela Freitas, 17 anos. Autora do blog: http://denovomaisumavez.blogspot.com.br/